Pesquisa relaciona redução do tamanho de peixes ao desmatamento na Amazônia
Foto: Divulgação/Instituto da Pesca de São Paulo
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Estudo
realizado pela USP mostrou que espécies de afluentes do Xingu são afetadas pelo
aquecimento das águas
MANAUS – O desmatamento na Amazônia está
provocando a redução do tamanho de espécies de peixes na região.
A constatação é de uma pesquisa desenvolvida no Instituto de Biociências (IB),
da Universidade de São Paulo (USP). Esta é a primeira
vez que pesquisadores brasileiros conseguem relacionar o desmatamento a
diminuição do tamanho de peixes.
A pesquisa é do ecólogo, Paulo Ricardo Ilha Jiquiriçá, sob a
orientação do professor Luís Cesar Schiesari, com a participação do estudante
Fernando Yanagawa. “Este fenômeno já foi observado em países da Europa
relacionado ao aquecimento global. Mas, no Brasil, é a primeira vez que
identificamos”, aponta o professor Luís Cesar Schiesari, orientador da
pesquisa.
Existe uma hipótese na literatura de que o aquecimento global
pode causar redução de tamanho de animais de sangue frio. “Neste caso, a causa
do aquecimento dos riachos é o desmatamento. A remoção da vegetação deixou os
riachos expostos aos raios solares”, explica Jiquiriçá.
Áreas agrícolas
Nas propriedades agrícolas observadas na pesquisa é comum a
degradação das matas ciliares e a construção de barragens que represam trechos
dos riachos, seja para armazenar água para o gado ou para abastecer pequenas
hidrelétricas.
O ecólogo conta que a região já conta com mais de dez mil
pequenas barragens. Os cursos d’água avaliados no estudo estão nas cabeceiras
de rios afluentes que formam o rio Xingu (rios Tanguro e Darro), no
centro-leste do Mato Grosso. A região é uma das maiores produtoras de
soja do País e está localizada no arco do desmatamento amazônico.
O estudo focou riachos afluentes do rio Xingu, nas
proximidades do município de Querência, no Mato Grosso. Os cursos d'água mediam
de 1 a 5 metros e tinham entre 5 e 80 centímetros (cm) de profundidade. Os
pesquisadores coletaram espécies de peixes em riachos de áreas desmatadas e em
locais de mata virgem.
A pesquisa foi realizada com todas as espécies de peixes que
a equipe encontrou nos locais entre 2011 e 2015. As espécies não são de
interesse comercial. “Na comparação, a temperatura média em riachos de
áreas desmatadas era 3,5 graus mais elevada que em riachos florestados. Em
horas mais quentes chegava essa diferença chegava a 6 graus”, diz Schiesari.
Jiquiriçá coletou quase 4 mil peixes de 36 espécies
diferentes na região de Canarana, no Mato Grosso, cidade conhecida como 'Portal
do Xingu'. “Os peixes coletados na pesquisa não são espécies de interesse
econômico, mas nos estudos realizados na Europa o fenômeno foi identificado em
espécies comerciais, em rios e mares, por conta do aquecimento global”,
observa. “É possível que a diminuição do tamanho dos animais seja um efeito
genético, mas também pode ser uma resposta fisiológica do indivíduo ao aumento
de temperatura”, acrescenta.
Redução de peso
Diversas alterações na fauna de peixes foram observadas nos
riachos em áreas agrícolas e relacionadas a alterações
ambientais. Jiquiriçá cita como exemplo uma espécie de rivulídeo,
parente dos “killifishes” de aquário, que mede menos de 4 cm e aumentou em
abundância nos riachos agrícolas. “Isso ocorreu devido as alterações das
características naturais dos riachos. Após o desmatamento, as margens desses
córregos são invadidas por gramíneas (Brachiarias) que reduzem a
profundidade e criam um ambiente onde os predadores dos rivulídeos não
conseguem alcançá-los, o que permite sua proliferação”, conta.
Em contrapartida, espécies que eram comuns nos riachos
desapareceram das represas. “Ao menos três espécies de pequenas ‘piabas’ que
eram comuns em trechos de água corrente não foram encontradas em trechos
represados”, conta.
Entretanto, a constatação que mais chamou a atenção foi a de
que quatro das seis espécies mais abundantes nos riachos estudados diminuíram
de tamanho (em massa), entre 44% e 57%, nas áreas agrícolas. “É provável que o
aquecimento da água seja responsável, ao menos em parte, pela redução de
tamanho dessas espécies” acredita.
Medições realizadas em campo mostraram que nos riachos de
florestas e ainda não alterados em suas características as temperaturas da água
eram, em média, entre 24 graus Celsius (°C) e 26°C. “Já nos riachos em áreas
agrícolas, nas horas mais quentes do dia, as temperaturas atingiram até 35°C”,
descreve. Para testar essa hipótese, o ecólogo realizou um experimento em
laboratório no Departamento de Fisiologia do IB em colaboração com o professor
Carlos Arturo Navas Ianini.
No laboratório foram criados peixes (da mesma espécie de
rivulídeo citada) em temperaturas semelhantes às dos riachos agrícolas e de
florestas. “Os peixes criados em temperatura semelhante às dos riachos
agrícolas perderam massa, diminuindo de tamanho, enquanto os peixes criados em
temperatura semelhante às dos riachos de florestas cresceram”.
A pesquisa não investigou os mecanismos fisiológicos que
levam à diminuição do tamanho dos peixes, mas constatou que a temperatura da
água é um fator preponderante. Jiquiriçá ressalta que este pode ser
o primeiro estudo a fazer a relação direta entre a redução de tamanho dos
peixes e o aquecimento provocado pela conversão de florestas em áreas
agrícolas. “É possível que isto esteja acontecendo ao longo de todo o arco do
desmatamento amazônico e que venha a causar perdas de biodiversidade”,
finaliza.
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*com informações da
Fapesp