Museu – Estudo aponta a preocupante perda de áreas verdes em Belém




 
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Nos últimos dias, as altas temperaturas têm feito os belenenses sentirem um calor insuportável. Para quem depende de água encanada, mesmo com banho frio para aliviar a quentura no período da tarde, sai do banheiro com a sensação de calor de antes de tentar refrescar-se. Especialistas apontam que a causa está na falta de arborização não só na capital paraense, mas também nos municípios da Região Metropolitana de Belém (RMB).
Só para se ter uma ideia, a Faculdade de Geografia e Cartografia da Universidade Federal do Pará (UFPA) desenvolve uma pesquisa intitulada 'Projeto de Estudo e Valorização das Áreas Verdes e Urbanas na Cidade de Belém', iniciada em março deste ano e prevista para ser concluída no próximo mês de dezembro, onde aponta que a capital paraense a cada ano perde um percentual da vegetação e a consequência é o calor constante, algumas vezes, independente de horário.
A falta de árvores nas cidades é preocupante, segundo a coordenadora do grupo de pesquisa, Luziane Mesquita da Luz. Ela explica que estudos sobre o Índice de Cobertura Vegetal (ICV) nas cidades apontam que a arborização para o equilíbrio térmico nas áreas urbanas deve estar em torno de 30% e nas áreas onde o índice de árvores é inferior a 5%, as características climáticas se assemelham a regiões desérticas.
'Nacionalmente nós adotamos o ICV de 30% em bairros e distritos, para ter o conforto térmico e climático. Mas, este índice foi medido para as cidades de clima temperado como, por exemplo, Curitiba', explica. Diante disso, a pesquisadora da UFPA afirma que para os belenenses sentirem um conforto térmico, o este índice deveria ser maior.
Ela comenta que quando os bairros chegam no percentual de 5% são classificados como desertos florísticos, por não ter mais as áreas verdes, o que influencia nas ilhas de calor, no aumento da temperatura e na diminuição da umidade.
Luziane observa que para Belém, o velho título de 'Cidades das Mangueiras' não se aplica mais na atual geografia da cidade. As alterações da qualidade ambiental urbana da capital paraense podem ser constatadas na expansão horizontal, com o aumento das áreas construídas, pavimentação asfáltica, crescimento da verticalização na área central, aumento da frota de veículos com congestionamento das vias públicas, poluição do ar, poluição sonora e retração da vegetação urbana.
É de fundamental importância elaborar uma nova cartografia das áreas verdes da cidade, com base em imagens de satélite de grande escala, levantar o histórico de criação das áreas verdes e o processo diferenciação do uso do solo para apontar o ICV e o Índice de Cobertura Vegetal por Habitante (ICVH). O projeto busca também elaborar mapas da cobertura vegetal em diferentes escalas: municipal, distrital e em nível de bairro.

Marco já tem característica de deserto

Até o momento, o que se concluiu do estudo foram os mapeamentos dos distritos. O Distrito Administrativo de Belém (Dabel), que concentra os bairros centrais, está com ICV 14,78%; o Distrito Administrativo de Icoaraci (Daico) ficou com ICV 47,41%, e os demais os mapeamentos estão em andamento.
Nos estudos realizados na escala dos bairros foram obtidos resultados de mapeamentos de cobertura vegetal e uso do solo na área central: Cremação estaria com 9,92%; São Brás, com 11,91%; Marco, 5,24%; Pedreira, com 4,54%.
Para a pesquisadora, o bairro do Marco é o que está em pior situação, porque 3% seria o Parque Zoobotânico Bosque Rodrigues Alves, considerada uma área privada em função de precisar pagar o acesso para desfrutá-la.
Na área de transição urbana, diz a professora Luziane, o bairro da Marambaia, fechou em 11,61%; e na de expansão urbana, Parque Verde está com 14,86% e Tenoné conta com 41,98%.
'Os resultados preliminares apontam para um quadro ambiental preocupante, porque tanto os bairros, como os distritos apresentaram um ICV abaixo do recomendado. Temos bairros carentes de áreas verdes que já apresentam características de desertos, sobretudo, na área central da cidade que possui grande adensamento urbano. Mas já podemos constatar perdas significativas de cobertura vegetal na área de expansão urbana, seguindo o eixo da Augusto Montenegro, que é alvo de intensa especulação imobiliária, com perdas crescentes de remanescentes florestais', avalia.
Ela chama a atenção para o Daico, que apresenta um ICV acima de 30%, por conta de ainda possuir extensa cobertura vegetal na parte sul, na área da bacia do rio Paracuri e às margens do rio Maguari, que abrigam remanescentes de floresta de várzea.

Plano municipal seria uma alternativa

Desde março deste ano tramita na Câmara Municipal de Belém o Plano Municipal de Arborização Urbana de Belém. A proposta tem por objetivo disciplinar a arborização da capital não só no que diz respeito às novas espécies, como à manutenção das existentes.
O coordenador do plano é o engenheiro agrônomo da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Semma), Paulo Porto. A proposta - no momento sob a avaliação da Comissão de Justiça da Casa parlamentar - regulamenta os artigos 61, 62 e 63 da Lei 8.655, de 30 de julho de 2008, do Plano Diretor do Município de Belém.
Paulo informa que o projeto foi elaborado com a participação de diversas organizações: secretarias municipais e estaduais, além do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Pará (Crea-PA), Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra), Museu Paraense Emílio Goeldi, Federação da Agricultura Pecuária do Pará (Faepa), Centrais Elétricas do Pará (Celpa) e Associação Comercial do Pará (ACP).
Dentre os objetivos, o Plano pretende estabelecer as diretrizes de planejamento, diagnóstico, implantação e manejo permanente da arborização de espaços públicos no tecido urbano; monitorar a quantidade, qualidade, acessibilidade, oferta e distribuição de espaços livres; utilizar a arborização na revitalização de espaços urbanos e seus elementos visuais; implantar e manter a arborização como instrumento de desenvolvimento urbano, qualidade de vida e equilíbrio ambiental; definir um conjunto de indicadores de planejamento e gestão ambiental de áreas urbanas e unidades de planejamento, por meio de cadastro georeferenciado dos espaços livres.
O engenheiro agrônomo lamenta, por exemplo, perda de espaços verdes de Belém e destaca a área da avenida Augusto Montenegro, Parque dos Igarapés (Satélite), Parque do Médice (Marambaia) e Parque Municipal de Mosqueiro.
Mas, ele chama a atenção mesmo para o Bosque Rodrigues Alves, que ao longo dos seus 128 anos sofreu prejuízo significativo da sua vegetação. 'Até o ano de 1883, o Bosque terminava na hoje avenida Pedro Miranda. Hoje, está com 15 hectares', informa.

Moradores da Cidade Velha reclamam do calor excessivo

Para quem mora há 30 anos no bairro da Cidade Velha, vinculado ao Distrito Administrativo de Belém (Dabel) sabe bem a diferença do clima da cidade. 'Está muito quente, não tenho dúvida. Com a evolução do bairro, aumentou o calor', diz o Roberto Gonçalves da Silva, de 72 anos. Ele e a esposa, Nagibe Eluan, de 62 anos, reclamam do desaparecimento das árvores porque, além das ruas serem estreitas, com o tempo foram perdidas por conta do tráfego de veículo.
O casal afirma que por causa do calor o melhor horário para ficar na frente de sua residência é no início da noite. Ao longo do dia, eles aproveitam um espaço que têm no quintal, que 'garante uma ventilação por conta da maré'.
A dona de casa Patrícia Helen Gouveia afirma que 'não há mais como definir momentos de calor ou de frio, porque sempre faz calor'. Na opinião dela, toda Belém está calorenta. Ela comenta que a maior preocupação são as crianças, porque só conseguem dormir tranquilas quando o ar-condicionado está ligado. Por causa do calor que ela comenta sentir no bairro da Cidade Velha, decidiu vender a casa para comprar outra no bairro do Umarizal, onde afirma ser mais 'fresco' do que o atual bairro onde mora.

Ocupações e especulação deixam Ananindeua sem arborização

O município de Ananindeua é outro município da RMB que apresenta escassez da sua vegetação. A explicação seriam as ocupações desordenadas, gerando o desmatamento aleatório. Mas, ao mesmo tempo, Luziane lembra que algumas áreas de moradia planejadas, como os condomínios horizontais, por exemplo, a Cidade Nova, também contribuíram para a falta de árvores em Ananindeua. 'Você pode observar que na Cidade Nova não há arborização e por isso é uma das áreas da RMB onde se registra maiores temperaturas', frisa.
Ela comenta que a tendência é de mais perda da vegetação na Região Metropolitana, por conta da expansão do mercado imobiliário e da não valorização da vegetação remanescente, tanto de várzea, como de terra firme, 'porque devastam tudo e constroem condomínios'.
A pesquisadora declara que o desafio no futuro é rearborizar a cidade e com espécies locais, assim como, fazer a população valorizar as espécies da região, como a samaumeira, tucumã, castanhola, bacurizeiro, Angelim pedra, taperebá, herbácea, pau-d'arco, inajá e açaí.

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